"Sou um evadido.
Logo que nasci
Fecharam-me em mim,
Ah, mas eu fugi."

Fernando Pessoa

MADRUGADAS

21 março 2008

ESTÁTICA

Voemos como aves de neblina
pelas penas da manhã
onde me esqueço
onde acabo e tu começas.

Acordemos soprando o pó
que dorme nos nossos lábios
enquanto as cortinas respiram
vultos como sóis enfermos,
poisemos nas vértebras do vento
e lancemos as horas pela janela;

Aqui, nascendo deste útero de vento,
desabemos em corpos de estática
enquanto ferimos a linguagem
da nossa própria carne,
respiramos as vagas
de um luar escuro
e engulimos o assobio das aves
de todas as meias-noites:

Trepemos os candeeiros de rouxinóis
onde a voz do fado se faz sentir
no suspirar do vento e segues
o rumo das constelações com cada suspiro.

Shh, eis que chega mais um pôr-do-sol
que murcha de encontro ao mar
como areias movediças,
branco ricochete de estrelas: dorme,
dorme que é tempo das nossas sombras
ronronarem como folhas ao vento:

Dorme.

João Coelho

1 comentário:

DORA disse...

João as tuas palavras são gritos silenciosos...